sábado, junho 04, 2005

Da série - Estórias do meu pai!

Por nenhum motivo especial, hoje estava recordando uma estória que ouço meu pai contar desde quando eu era pirralhinha, e sei lá, me deu na telha de contar aqui pra vocês.

Primeiro, uma explicação: Meu pai nasceu numa cidadezinha do Sertão de Pernambuco chamada Ouricuri. Morou lá até adolecente, quando se mudou para a Capital para continuar os estudos. Vive no Recife até hoje, mas sempre foi homem de raízes e coração sertanejos. Eu e minha irmã nascemos e fomos criadas entre Recife e Olinda, mas crescemos viajando todos os meses de Janeiro com mamãe e papai, para passarmos as férias de verão em Ouricuri. Meu pai vem de família grande, e Janeiro sempre foi o mês de reunir a família na casa da minha avó, passando os dias nas andanças na Fazenda, subindo em pés de umbuzeiros, ou escalando os cercados do curral para espiar o gado, as novas aquisições de um tio ou outro, o bezerrinho novo que acaba de nascer, ou o touro brabo que alguém tenta amançar... As noites consistiam de jantar em volta da enooooorme mesa da minha avó, depois esperar o sino da Igreja de São Sebastião começar a anuciar a hora da Missa.. depois, as diversas festas que são comuns na cidade durante esta época... Uma vez no mês era promovido o grande churrasco de bode, lá na Fazenda, que contava a iluminação de uma fogueira gigantesca, e música sertaneja.
Janeiro tem as festas de São Sebastião, que é Padroeiro de Ouricuri, e a Festa de São Brás. A cidade se enche de pessoas como o meu pai, originadas de Ouricuri, que vivem na cidade grande, e voltam nas férias.
E assim passei a maioria dos meus Janeiros, até casar e me mudar para cá.

Minha mãe, com minha irmã no colo, eu em pé, e meu pai, em Ouricuri (1972)

Eu, também em Ouricuri

Pois bem, dada esta explicação, tem uma estória que vira e mexe, meu pai gosta de contar.
Aconteceu quando ainda eu e minha irmã éramos muito pequenas, numa dessas viagens.
Saímos do Recife ainda no meio da noite. Naquela época, meus pais dirigiam para Ouricuri, alternando à direção entre um e o outro.
Meu pai dirigiu boa parte da estrada. Depois minha mãe pegou a direção, e foi a vez dele descançar. Diz ele que mesmo cansado, não conseguiu dormir, por conta de não querer deixar a minha mãe sozinha atrás do volante. Então ele baixou o assento do carro para ficar numa posição mais confortável, e ficou entre um cochilo e outro, sempre de olho na estrada.
Eu e minha irmã íamos deitadas no assento traseiro, dormindo o sono inocente das crianças.

Em um determinado ponto, um carro ultrapassa o nosso. Daí, diminui a velocidade e faz um sinal, que minha mãe não entendeu, ou ignorou. Minha mãe ultrapassa o carro, e segue viagem. Daqui a mais alguns minutos, o carro volta, e cola na trazeira do nosso carro. Minha mãe continua firme no volante, sem entender muito bem o que se passa. O breu da noite ainda é grande, e além dos dois carros, não há mais nenhum outro na estrada. A região é de Serra Talhada, aonde de um lado é montanha, do outro é abismo.
O carro ultrapassa o nosso novamente, e faz um sinal. Meu pai que até então vem observando, pergunta:

-Edilza, esse carro fez sinal mandando parar, ou foi impressão minha?
-Não, acho que ele está querendo que eu pare!

Agora veja bem esta situação: A noite é escura, no meio de uma estrada deserta. Lá está a minha mãe, na época ainda jóvem, nos seus 30 e poucos anos, ao volante do nosso carro. O outro carro, levava dois homens de aparência suspeita. Meu pai, um homem inteligente deduziu que, como ele tinha este tempo todo o assento reclinado, provavelmente os dois homens só viram a minha mãe, pensaram que ela estava sozinha.. Agora eles tentavam fazê-la parar o carro.. A intenção, provavelmente não era das melhores. Tá sacando o drama?
Meu pai teve que pensar rápido. Falou para minha mãe:

- Se eles fizerem sinal mandando você parar novamente, eu não quero que você acelere - o penhasco de um dos lados da estrada oferecia grande risco neste caso - Você vai parar o carro, mas eu quero que você alinhe a minha porta (do lado do passageiro) com a porta do motorista, lado a lado. - E agachou-se, abrindo o porta-luva do carro para pegar seu 38, que sempre carregou consigo nessas viagens. Como um bom fazendeiro, meu pai sempre teve boa pontaria, e bom manejamento de arma, especialmente espingarda, por causa das caçadas pelas terras da Fazenda.

Minha mãe gelou, mas diante da situação, viu que não havia outra alternativa. Nessas horas a gente faz o que tem que ser feito para se defender, e estava em jogo não somente a segurança deles dois, mas como a nossa, minha irmã e eu, que dormíamos no banco de tráz, alheias a tudo.
Meu pai pegou o revólver, mas não conseguiu encontrar as balas. Minha mãe havia colocado a caixinha com balas em um outro lugar, longe do revólver, atitude que agora pareceu burrice.
Meu pai não teve tempo para procurá-la, e tinha que agir rápido, já que o outro carro estava de volta a fazer sinal de luz mandando a minha mãe parar.
Instruída pelo meu pai, ela fez como ele falou, e parou o carro assim, porta do meu pai com a porta do motorista.
Meu pai, para surpresa dos dois homens do outro carro, já abriu a porta com revólver em punho, na cara do motorista. Diz ele que o homem embraqueceu. O outro, virou a cara para o outro lado. No melhor estilo filme de Hollywood, com a vida imitando a arte:

- Tá querendo o que, companheiro?- Perguntou meu pai. O homem, gaguejando e empalidecido foi dizendo que só tinha parado para pedir um cigarro.
- Pedir um cigarro? PEDIR UM CIGARRO? No meio da madrugada? Numa estrada deserta? Forçando a pessoa a parar o carro? Não acha um absurdo isso não? - e o homem lá, cheio de "mas-mas".. Meu pai continuou:
- Aqui ninguém tem cigarro. Vá tratando de entrar no seu carro e se mandar, antes que eu coloque "um cigarro" na sua cara agorinha mesmo! - Eita cabra macho esse meu pai. Sempre foi assim!

Daí o homem volta pro seu carro e se manda. E meus pais ficam alí ainda por alguns minutos tentando acalmar os nervos. Passado o ocorrido, minha mãe desata a chorar, e muito trêmula não tem mais condições de dirigir. Meu pai então, pega a direção de volta e vai dirigindo até encontrar um Posto da Polícia Rodoviária, aonde dar parte do incidente. Os policiais reconhecem a descrição do carro, e diz que um carro assim-assado parou ali naquele "restaurante de beira de estrada". Meu pai vai lá pra conferir, e fazer reconhecimento. E dito e feito, os dois homens estão lá, sentados numa mesa. Eles também reconhecem o meu pai na horinha, e um deles coloca a mão na cintura, indicando que também tem uma arma, e agora está preparado. Meu pai não faz ou diz nada, só volta ao Posto Policial para afirmar que a descrição dos policiais confere. Mas aí, os policiais dizem ao meu pai que não podem fazer nada, já que não houve nada, e na verdade foi meu pai quem apontou a arma para os caras, então neste caso, não existe muito o que fazer. Meus pais, muito frustrados, resolvem seguir viagem, mas meu pai segue satisfeito que fez o que precisava ter feito para proteger sua família na hora do perigo.
O dia já está amanhecendo, e logo estaremos em Ouricuri.

Como o diz o velho ditado; o segredo é de fato a alma do negócio. Está aí meu pai, com um revolver sem bala, pra confirmar isso. Apenas ele e minha mãe sabiam deste fato. O que diriam aqueles dois caras se soubessem deste pequenino detalhe?

Estória verídica!

9 comentários:

Anônimo disse...

A estória prende, realmente sensacional. Muita coisa em jogo. Uma arma para quem sabe usá-la, e seu pai soube, e que ninguém critique, pois a ausência e descaso policial dão ao homem de fé aval para agir por sua iniciativa. Passaram um grande perigo. Deus os ajudou e a honra de seu pai foi enorme. Estão de parabéns. O pai deve ter ensinado, certamente ensinou pelo homem que você aprsenta dele, muitos valores a sua mãe, vc e sua irmã.

Anônimo disse...

Que loucura hein Laurinha...cabra macho seu pai mesmo né??
Qto a TV pirata, realmente eu tinha 6 aninhos na época, assistia meio q na clandestinidade pois já era hora de estar dormindo! Depois q chegar o DVD me conta ok? vem tds os episódios? Beijos

* Acho q Paulzinho lembra vc qdo era criança...

Laura_Diz disse...

Vc tem jeito pra prosa, hein moça, mto bom. Gostei.
abs, laura

cris disse...

olá...achei q tinha entrado no blog errado hehehhehe mas mudanca sempreé bom.. to passando rapidinho pra desejar boa semana...volto depois com calma pra ler...
beijinhos

Toninho disse...

Fiquei fã do seu pai! :)

Anônimo disse...

Vc era lindinha demais...Olha acho que ela nao aceitaria a entrevista.. ela e muito famosa..passa hoje no meu blog e ler a nova entrevista...nunca vi alguem falar assim...vai lå e confere!!!!

Andréa disse...

Amei as fotos e o texto! E adorei o novo visual do blog! Tambem estou mudando o meu. Ja ja vai aparecer.
Eu nao tenho a Globo aqui, portanto nao vejo mais o Fantastico... Mas ouvi de amigos e li na Folha de SP (online) tudo sobre a visita da banda ao Brasil. Eles nao sao meus favoritos, mas eu curto bastante.
Beijocas!

Laurinha disse...

Valeu, gente!
Beijos

Anônimo disse...

Oh Laurinha , peco desculpa..ok..foi a outra Laurinha, entao?

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