quarta-feira, março 16, 2005

Ontem Paul foi fazer o Imposto de Renda da gente com a contadora que contratamos, e voltou com a bomba! Não somente nós não vamos receber nenhuma devolução este ano, como também nós estamos devendo 4 mil dólares ao Mr. Sam. Eu só faltei morrer quando ele me disse. Não que eu sou daquelas que fica contando com o ovo no fundo da galinha, mas desta vez eu confesso que estava sim. Desde que compramos o apartamento da gente no ano passado que o povo vive nos dizendo "eita, vai receber um dinheirão de imposto de renda", porque a gente declarando as parcelas mais Paulzinho como dependente, é uma boa combinação.
Que nada! Ainda estou pra ver essa dinheirama toda que dizem que o Governo nos devolve.

Isso me leva a outro assunto: O de como é dificil morar neste País. A 10 anos que eu moro aqui e desde o dia que coloquei os pés neste País tive que ralar bastante, tudo muito sacrificado.
Se você quer morar aqui, tem que vir com uma filosofia na sua cabeça "cada um por si, e Deus por todos" Aqui ninguém ajuda ninguém não.
Ou pode ser também somente o povo que eu conheço, lucky me!
A família do meu marido é um zero a esquerda. Se juntam em festinhas de aniversário e de final de ano, depois disso nem parece que você existe. As amizades são antigas mas eternamente superficiais. Uma vez eu tive que levar o meu marido a emergência do Hospital, Paulzinho era bebê de colo. Não teve ninguém que oferecesse para tomar conta dele. Eu tive que levar ele também, e passei 6 horas lá no hospital segurando ele nos meus braços, no tempo que meu marido ficou lá.

Outra coisa, as empresas americanas. As leis trabalhistas aqui são feitas para beneficiar o empregador, e não o empregado.
Pra você ter uma idéia, no Brasil eu trabalhava no Sebrae. O salário era mais ou menos, mas os benefícios eram fantásticos. Além de 1 mes de férias e todos os feriados remunerados, havia toda uma mordomia (ticket refeição, condução, serviço de taxi a disposição para ir e vir, todas aquelas festinhas maravilhosas com muita comida, bebida e musica ao vivo, presentes de final de ano..)
Empresa Americana é mão de fome (CEO Tio Patinhas). Coorporate America como eles chamam, segue aquela filosofia Kennedy (não pergunte o que sua empresa pode fazer por você, mas o que você pode fazer por ela).
Eu trabalho na mesma empresa a 7 anos, só tenho direito a 3 semanas de férias remuneradas (até completar 5 anos eram apenas duas) e uma semana para uso pessoal ao ANO! Isto mesmo, ao ano. Feriado, a minha empresa só observa 6 (Natal, Ação de Graças, Ano Novo, Dia da Independência, Dia do Trabalho e Memorial Day - que é o dia dedicado aos mortos de guerra). Os outros feriados não importam, porque na verdade o empregador aqui tem esta opção de escolher se vai observar o feriado ou não. Então Páscoa que vem ai, por exemplo, pode esquecer. Tem que vir trabalhar sim, apesar de uns 80% dos Bostonianos serem de origem Irlandesa-Católica.
Ah, ticket refeição, etc, HAHAHAHA!!!! Que piada! Nunca ouviram nem falar. Invenção brasileira como nome americano? Não sei.
Festinhas? tem sim, mas a gente que banca. Nos 7 anos que trabalho no lugar, nunca participei de uma festa natalina promovida por eles. Sempre tive que levar o meu pratinho, assim como todos os outros colegas de trabalho. Aliás, Americano no geral adora fazer festa nestes termos.
O salário é bom. Eu nunca ganhei tão bem como ganho agora. Mas morar aqui é tão caro, as minhas contas são tão altas, que uma coisa termina cancelando a outra. Quer ver?

- Creche do meu filho - 250 dólares por semana. Isso ai é mais caro que o valor de uma escola particular, e só um pouquinho mais baratinho que o valor de uma faculdade assim, das menos caras. Pois é, quer ter filho aqui? Tem que ter dinheiro pra bancar mesmo. Não tem vovó, nem vovô, nem titia pra ajudar a cuidar não, como tem neguinho cansado de fazer lá no Brasil.
Minha cunhada que tem 2 filhos adolecentes, desde que esses meninos começaram a trabalhar que ela diz que se eles quiserem morar com ela, tem que pagar aluguel. Minha cunhada é uma mulher desmiolada do juizo, mas o que ela está fazendo é prática comum aqui.
No Brasil, o cara mora com os pais até depois dos 30.
Então concluindo, são 250 dólares semanais, so para o seu filho desenhar com lapis de cêra, cantar musicas de roda, e tirar aquele cochilinho de tardezinha.

Moradia aqui? Aluguel em um lugar descente não sai por menos de 1000 dólares por mês. Pagamento de casa própria, bem.. as do meu apartamento são 1800 dólares. Com mais uma taxa de condominio de $200.

Quer dirigir em Boston? O seguro do carro é obrigatório, e não se assuste se acabar pagando por ele mais que o valor do próprio carro. O seguro do meu é um pouquinho mais que 300 dólares por mês. Pelo carro eu pago $256.

Tá dando pra sentir o drama?

A verdade é que Boston é uma cidade caríssima. Eu moro aqui porque casei com um americano. Mas se tivesse vindo tentar a sorte assim como tantos brasileiros que eu vejo aqui, não sei se teria durado este tempo todo não.
As vezes, em dias em que estou aborrecida e com saudades de casa (como hoje por exemplo) eu fico olhando a meu redor e procurando o que há de tão espetacular que faz desta cidade tão cara. Por que uma casa aqui está custando uma média de uns 350 a 400 mil dólares, por exemplo?
O inverno é intenso e insuportável. As praias são as coisas mais sem graça que já vi na vida, com uma água gelada de doer os ossos.
A diferença entre brasileiro e americano, é que eles valorizam o que é deles, e nos valorizamos o que é deles também (deveria ter dito similaridade, não diferença).
Se eles tivessem aqui uma praia como Boa Viagem lá do Recife, nossa, custaria o que morar aqui?
Tá bom, tem o sistema universitário que é um dos melhores do mundo, e os melhores médicos também. Mas isso custa muito caro mesmo. Eu pago 109 dólares semanalmente pelo meu plano de saúde, que são descontados diretamente do meu cheque, eu não chego nem a ver este dinheiro. E o pior é que este valor não cobre 100%. Tem coisas que eu tenho que pagar por fora. Portanto, coisa boa que custa caro, todo lugar tem.

A verdade é que eu sou uma brasileira esnobe. Eu me acostumei com a segurança e sou viciada nas comodidades americanas, admito. Mas colocando estas coisas de lado, eu morro de saudades da terrinha. Eu voltaria hoje se pudesse. Todos os anos que eu passo aqui só servem mais para apreciar as coisas que eu deixei lá.
Copiando aquele comercial do Mastercard - Dólar, produtos de primeira, Faculdade de Harvard custa caro. Mas família, amigos, tradições, raízes, poder falar Português, comer tapioca assim feita na hora, água de côco na praia de Boa Viagem, ser criada por vó - PRICELESS!

Estou assistindo a novela nova da Globo, porque tenho Globo Internacional. Mas já estou aqui balançando a minha cabeça para os exageros.
"Isso aqui minha filha é AMERICA!" mostrando o snowglobe pra menininha - "Neste lugar tudo funciona, tudo é perfeito, todo mundo é feliz!" - Ih!! Menos dona Maria, menos!!!

E pra concluir, uma poesia de Vinicius de Morais, que tem muito a ver com a minha cara

Pátria Minha

A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria.
Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.
Se me perguntarem o que é a minha pátria direi: Não sei.
De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.
Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!
Porque te amo tanto, pátria minha,
Eu que não tenho Pátria,
Eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho,
Eu que permaneço em contato com a dor do tempo,
Eu elemento de ligação entre a ação o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!
Tenho-te no entanto em mim como um gemido de flor;
Tenho-te como um amor morrido a quem se jurou;
Tenho-te como uma fé sem dogma;
Tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito
Nesta sala estrangeira com lareira
E sem pé-direito.
Ah, pátria minha,
Lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra
Quando tudo passou a ser infinito e nada terra
E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu
Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz
À espera de ver surgir a Cruz do Sul
Que eu sabia, mas amanheceu...Fonte de mel, bicho triste, pátria minha
Amada, idolatrada, salve, salve!
Que mais doce esperança acorrentada
O não poder dizer-te: aguarda...Não tardo!
Quero rever-te, pátria minha,
E para rever-te me esqueci de tudo
Fui cego, estropiado, surdo, mudo
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.
Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta lábaro não;
A minha pátria é desolação de caminhos,
A minha pátria é terra sedenta e praia branca;
A minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra e urina mar.
Mais do que a mais garrida a minha pátria tem
Uma quentura, um querer bem, um bem
Um libertas quae sera tamem
Que um dia traduzi num exame escrito:"Liberta que serás também"
E repito!
Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Que brinca em teus cabelos e te alisa
Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Que vontade de adormecer-me entre teus doces montes, pátria minha
Atento à fome em tuas entranhas
E ao batuque em teu coração.
Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha Brasil, talvez.
Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama...

Texto extraído do livro "Vinicius de Moraes - Poesia Completa e Prosa"

2 comentários:

Anônimo disse...

Laurinha... Esse post de hoje está bem denso... feito pra se refletir.
Refletir é o mesmo que: olhar por dois lados. Ver com outro ângulo... lados diferentes.
Lendo seu texto é claro e notório a sua paixão pelo nosso Brasilzão e principalmente por Pernambuco.
Mas temos que refletir!!!
Tenho certeza que todos (inclusive eu) adorariam a sua volta para o Brasil. Mas, PARE e PENSE, sobre o que isto significa.
O Brasil é um país maravilhoso, onde temos mil oportunidades, mil facilidades, mil amigos... mas também é um lugar onde se mata por um par de tênis, e até por muito menos, por R$ 2,00!!! Já houveram casos de morte por assalto onde a vítima só tinha R$ 2,00 no bolso, ou seja, menos de US$ 1,00!
Fora a violência, que já é assunto mais do que batido em todos os jornais, o Brasil tem os absurdos da corrupção, os escândalos das prefeituras, contra o povo, contra a nação... Aqui, os direitos são apenas para os ricos e muito ricos... o resto é resto.
Adoro o Brasil. Acho uma nação de gigantes, mas se pudessemos ter a segurança que vcs tem aí, somada a uma economia estável, com um país que investisse em tecnologia em prol da população, aí seria perfeito.
Amigos??? Aqui estão cada vez mais raros... e o agravante daqui é que os brasileiros se acham muito intimos de vc muito rapidamente.... e muitas, mas muitas vezes mesmo, assim que se sentem intimos te apulhalam pelas costas, muitas vezes te prejudicando seriamente. E o que acontece com eles? Nada... impunidade. Outra palavra comum no dia-dia brasileiro.
Aqui tudo acaba em pizza.
Entendo a sua saudade do Brasil, mas a pergunta que nao quer calar é: Será que vc iria se re-adaptar???? DUVIDO!
Tudo é tão chocante que até eu, que passei apenas um mes com vc em Boston, quando voltei, tomei um choque com as coisas que presenciei aqui.
Pense bem! Reflita!

Anônimo disse...

Oi, concordo em muitas coisas...
moro em Seattle e adoraria juntar as brasileiras casadas nos usa para dar suporte emocional e fazer verdadeiras amizades ...
meu blog fala de mim no profile e outros blogs..
interesada me avisa
boa sorte

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